CASA PODEROSA DOS FILHOS DE YEMANJÁ

CASA PODEROSA DOS FILHOS DE YEMANJÁ

terça-feira, 5 de junho de 2012

PROJETO CANDOMBLÉ E ECOLOGIA


Osonyin alawo wa, sawure pipé Orisa ewé.


Osonyin alawo wa, sawure pipé Orisa ewé"


("Ossain é nosso sacerdote, faça-nos o encanto


Que nos traga boa sorte em sua totalidade, 


Ó orixá das folhas")




Sinopse 
Uma inovadora e consistente visão das relações a um só tempo comuns e complementares entre o movimento ecológico e o candomblé.


Ambientado no contexto de tenso desenvolvimento urbano da mais negra cidade do Brasil, o documentário revela as dificuldades da religião afro-brasileira em enfrentar a dinâmica de uma sociedade de mercado, e se desenvolver no tecido problemático da vida urbana contemporânea, que inflete violentamente sobre os espaços verdes, sagrados para os adeptos do culto.


Os ambientalistas baianos toparam com uma visão de mundo onde a natureza é fundamental ('sem folha não há orixá') e, em conseqüência, viram que nenhum discurso sobre a questão ambiental na Bahia pode passar ao largo do candomblé. Sacerdotes e militantes se fortalecem com esse encontro. 


Os terreiros percebem de imediato que a questão ecológica também pertence a eles. 


E essa aproximação de uma visão ancestral da natureza, confere originalidade e uma outra consistência ao discurso e à prática ambientalistas na Bahia.


"O que não se registra, o vento leva" (Mãe Stella)
Abordagem 


"Nas sociedades africanas pré-colonias, de uma maneira geral, não existe distinção entre sociedade e natureza. 


Tudo está untado, melado, sujo, emporcalhado do sagrado, tudo é natureza. 


Não há distinção. Até na organização social, na qual o poder político se confunde com o poder emanado do universo sagrado." (Julio Braga)




O segredo é um preceito sagrado nos cultos afro-brasileiros, estando associado aos ritos iniciáticos que vão, aos poucos, revelando para os adeptos desse sistema de crenças, a cosmogonia do candomblé.




Não abordar o segredo e, ao mesmo tempo, não sonegar a informação. 


Esse é o desafio! 


Sempre tendo o cuidado para não revelar os fundamentos secretos do candomblé, reservados apenas aos iniciados, um dos mais originais aspectos dessa religião.


O documentário deve circular entre detalhes do cotidiano e princípios essenciais. 


A compreensão do mundo em que vivemos. 


O exercício da tolerância e do entendimento do outro. Solidariedade e comprometimento. 


Futuro da comunidade e da religião.


A consideração ética em relação a tudo isso tem papel decisivo na construção da linguagem e é vital do ponto de vista da própria estrutura da narrativa.




A linguagem do documentário tem como uma das linhas estruturais a utilização da própria forma de expressão e transmissão do candomblé, via orikis (poemas), que mesmo recriados em português mantém características como: frases curtas e cadenciadas, ritmo de acordo coma respiração e o elemento melódico da tonalidade, que segundo Verger é a forma como o conhecimento é transmitido na África.


Permeando toda a narrativa, como eixo estrutural, a história de Lívia Ferreira, mãe-de-santo em formação, que aos vinte e dois anos, faixa preta de karatê (2º Dan), encontra-se no processo de assumir sua casa, sua roça, seu axé. 


Motivo de "fuxico" para o público interno (também uma forma de aprendizado) e verdadeira preciosidade para o público fora do culto, que vai se confrontar com a motivação, com a ação pré-instalação de uma casa-de-santo. 


Um terreiro de Iansã, com a representação de todos os orixás. Ilê Axé!


Uma biografia se fazendo, buscando uma abordagem sensível e verdadeira, diferenciada mesmo, do tratamento do resto do filme. Enquanto segue os passos de Lívia na formação da sua casa, a câmera respeita o tempo, o segredo, a emoção, e pontua o que é acessível. 


A história de Lívia, suas lutas, seus desafios. Sacrifícios da liberdade individual, o peso da solidão, a obediência ao seu destino.
Tratar a trama com seriedade e carinho, pelo amor com que Lívia encara suas responsabilidades. 


Ouve e sabe o quanto é grave e severa a não observância dos preceitos. 


A necessidade de liderar e impor sua autoridade com intensidade total e entrega absoluta, ciente do dever de respeitar com rigor e precisão as tradições. 
A comunicação de Lívia, o que muda, como age na relação com os seus "filhos". 


O candomblé reverencia a ancestralidade, o princípio da senioridade, o ensinamento dos mais velhos. Lívia é o contraponto. 


O saber vem no momento de aprender, na obediência, na hierarquia, no movimento cotidiano em seus mínimos detalhes: o comportamento nos rituais, as formas de servir, de se trajar, de dançar, de comer...
"Religião é cultura. 


A religião estática perecerá. Como sinal dos tempos, não é mais possível a prática da crença Orixá sem reflexões, estudos e entrosamentos.


Não podemos ficar confinados no Axé. 


A tradição somente oral é difícil. 


Os Olorixá têm que se alfabetizar, adquirir instrução, para não passar pelo dissabor de dizer sim à própria sentença". 
(Mãe Stella)


Necessário avançar na comunicação, entendendo o limite da transmissão de conhecimento baseado estritamente na tradição oral - num mundo intermediado, hoje, pela mídia.


 Novas formas de preservação do saber, onde a oralidade é gradativamente substituída por instrumentos cada vez mais sofisticados de anotações, gravações mecânicas, e até mesmo leitura informatizada. 


"A tradição no candomblé é tão dinâmica quanto a noção de mudança. 


É como se pudéssemos pensar que alguma coisa fosse capaz de mudar, permanecendo". (Júlio Braga)


Contrastes, confrontos e diferenças resultantes da dinâmica da cidade pontuam o roteiro, onde tempos distintos - e espaços diferenciados - convivem , complementam-se e se excluem. 


A vida religiosa, o contexto urbano, o embate ecológico e a dinâmica social envolvem mundos paralelos suscitando o diálogo, ao mesmo tempo que a estigmatização e o complexo exercício do convívio com essa multifacetada e provocante realidade. 


É esse painel que, levando em consideração a tolerância e a convivência como estão postas nos marcos da sociedade local, permite apresentar as tensões entre os distintos pontos de vista dos diversos "atores" do mundo moderno, tematizando um cotidiano que escapa completamente à leitura exotizante e empobrecedora que folcloriza, hoje, a cultura baiana.





Nenhum comentário:

Postar um comentário