CASA PODEROSA DOS FILHOS DE YEMANJÁ

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sexta-feira, 15 de março de 2013

Por quê o Candomblé “Verde”?


Primeiro preciso dizer por quê o candomblé.

(  Edilene Mora )
Pois bem, minha família é quase toda espírita, porém são parte umbandistas - de uma corrente antiga, onde ainda não se tentava imitar o candomblé, e, portanto, não existia sequer a menção de sacrifício de animais - e parte kardecistas. Fui criada nessas crenças, mas me faltava alguma coisa. Fui conhecer diversas religiões, e não me senti "em casa" em nenhuma, até o dia, já passada dos 30 anos, em que conheci o candomblé. Me encantei pelas músicas, as roupas coloridas, danças, a energia viva, presente em todos os "xirês" - festas de orixás - e a aparente união, cooperação, humildade dos integrantes daquela comunidade. 

Mas quem conhece uma festa de candomblé não conhece absolutamente nada do que é a religião. A festa é apenas a comemoração de todos os rituais que foram realizados por uma razão ou em função de uma pessoa ou ocasião. A festa é a menor parte da coisa. E para conhecer o resto, ou seja, conhecer o candomblé, só estando dentro. Eu entrei.
Fiquei maravilhada com os ensinamentos, a cultura do povo africano transportada para cá, tudo no candomblé me fascinava, e fascina até hoje, com um único porém: a matança de animais. Essa parte sempre foi para mim um tormento, por mais que tentassem me ensinar a finalidade daquilo tudo. Eu sofria demais com aquilo, mas não conseguia me desligar da religião, como não me desliguei até hoje, pois todo o restante sempre me fez muito bem. Tentava minimizar aquilo, e me convencer dos argumentos que me apresentavam, e durante os sacrifícios eu me concentrava em rezar pelo animal, e pedir que ele não sofresse, que Olorum o recebesse rapidamente. E me ocupava também de cuidar bem dos animais que ficavam na casa aguardando os sacrifícios, e cuidar para que ninguém os maltratasse mais do que o absolutamente necessário...

Fui uma filha muito dedicada de um pai de santo que depois provou ser pior que qualquer padrasto. Aproveitador, sem-vergonha, manipulador, extorquia sem dó de qualquer pessoa mesmo seus últimos recursos, prometendo ajuda e recompensa espiritual. Eu o deixei, e à sua casa, logo após a minha iniciação, não apenas por perceber essa conduta, como por perceber que ele sempre pedia aos consulentes e filhos de santo muito mais do que era necessário para qualquer "trabalho", oferenda espiritual, principalmente em animais para sacrifício. Por que? Porque isso enche os olhos de quem está ali à procura de uma "macumbinha", pagando para conseguir isso ou aquilo, e quer ver coisas que impressionam, que chocam, que atestam que está sendo feita alguma coisa em troca daquele dinheiro, porque, infelizmente, o ser humano tem uma curiosidade por tudo que é macabro, assustador, impressionante. Pelo lado do pai de santo, quanto mais bichos e coisas, mais caro ele podia cobrar. 

Pois bem, enquanto estive na casa dele me aproximei muito de um outro pai de santo, que era "pai pequeno" lá, e que gostava muito de plantas, e pregava o uso de plantas e ervas nos trabalhos e rituais. Quando saí dessa casa esse outro pai de santo também já tinha saído, e tempos depois nos reencontramos e, junto com outras pessoas, também desligadas dessa casa, montamos a nossa própria. Lá a preocupação era nos mantermos na maior simplicidade possível, e fui feliz lá por mais um tempo. 

Acontece que o dinheiro corrompe, a vaidade estraga, a arrogância domina e a pessoa se perde quando acredita ter algum "poder". Também nessa casa comecei a ver os abusos e excessos. Animais em excesso para sacrifícios, montes de comida preparadas para oferendas e depois jogadas no lixo, luxos e gastos desnecessários, feitos para "encher os olhos" do freguês. Nessa época eu já atuava na proteção animal, e a cada ritual de sacrifício me sentia doente, e os argumentos da religião não me convenciam mais. Me afastei e por fim me desliguei completamente também dessa casa, juntamente com mais pessoas (não por coincidência, quase o mesmo grupo que tinha se desligado da casa anterior). 

A partir daí decidi pesquisar e estudar alternativas para continuar com a minha religião, que amo, sem o sacrifício animal, que considero desnecessário e incongruente. Meus argumentos eram apenas instintivos, mas convincentes. Como este post já está se extendendo demais, não vou relacioná-los aqui, mas vou descrevê-los em outro post. Nas minhas pesquisas encontrei livros sobre o sangue verde, das folhas, "ewé", energia muito mais pura que do sangue animal, porém, renovável. Energia obtida sem a necessidade da morte de quem a fornece, e portanto, a meu ver, muito mais sagrada. E minha mais grata surpresa nessas pesquisas foi saber que um grande ícone da religião, Agenor Miranda Rocha, concordava com tudo isso há muitos anos!! Veja o que diz desse homem a Wikipédia: 

"Agenor Miranda Rocha, o Pai Agenor, (Luanda, Angola, 8 de setembro de 1907 — Rio de Janeiro, 17 de julho de 2004) foi um babalorixá do Candomblé.
Foi iniciado aos cinco anos de idade por Mãe Aninha, Iyalorixá fundadora dos terreiros Axé Opô Afonjá de Salvador e do Rio de Janeiro.
Era professor catedrático aposentado do Colégio Pedro II, estudioso e adivinho do candomblé, o brasileiro que mais conheceu a herança e a Cultura afro-brasileira.
...
Suas declarações são desconcertantes. “A força do candomblé está no sangue verde das plantas e não no sangue vermelho dos animais”, comenta para condenar os sacrifícios em cultos. ..."

O resultado de tudo isso que eu relatei? Nosso grupo de candomblecistas, dissidentes e malvistos pelas casas de onde saímos, hoje pratica o "candomblé verde". Em nossas oferendas, apenas grãos, folhas, flores, e mesmo essas são colhidas com muito respeito, jamais colhendo muitas folhas ou flores da mesma planta, sempre regando a planta que nos ofereceu parte de si, e agradecendo aos orixás pelas bençãos e pedindo mais força e energia para aquele ser vivo, aquela planta. A simplicidade é o que nos norteia. Preparamos comidas para oferendas em pequena quantidade e de forma que fiquem saborosas, pois é delas que nos alimentamos após os rituais. Fazemos nossos trabalhos na mata, ou em um lugar apropriado para isso em Juquitiba, o Vale dos Orixás, e sempre nos preocupamos de levar embora o nosso lixo. Nada de alguidares de barro nas oferendas, apenas folhas servindo de prato. Animais nas oferendas? Sim, nós às vezes oferecemos animais aos orixás. Compramos nos aviários os pombos que estão ali para serem vendidos para sacrifício, e os soltamos na mata. Até mesmo galinhas, patos, pois no Vale dos Orixás esses animais encontram alimento e proteção. Existem até cabritos, bodes, vivendo no Vale! Então a nossa oferenda é poupar pelo menos essa vida, que não teria outro destino ali no aviário que não a morte.

Os Orixás são forças maravilhosas, energias da natureza, nos trazem conforto e paz, força e coragem para seguirmos nosso caminho, batalharmos nosso dia a dia, conquistarmos o que desejamos por nossos próprios méritos, pois o Orixá não enriquece ninguém de dinheiro, mas apenas de saúde, paz e força para trabalhar e alcançar a vitória. Sou candomblecista sim, sou macumbeira sim (macumba não é sinônimo de despacho e sim de festa, comunhão, alegria), visto branco, uso colares coloridos e panos na cabeça, não me envergonho de quem eu sou nem da minha crença, não escondo meu orixá, me orgulho muito dele. Mas cultuo meu orixá e minha religião através da vida, e não da morte de inocentes. 

Sou malvista, taxada de louca, marmoteira, dentro da religião? Sim, mas apenas por aqueles que descobriram na religião o seu filão, o seu modo de extorquir os incautos, como shows cheios de cenários e acessórios e atos ensaiados (posso afirmar, com segurança e propriedade, que o que se vê em vídeos na televisão é show ensaiado sim); por aqueles que não querem que as pessoas saibam que não custa quase nada agradar ao seu Orixá; ou por aqueles que não querem abrir mão de seu "poder", se for revelado que o Orixá não está naquele pote cheio de sangue e naquela carcaça morta, e sim no coração de cada filho e na natureza VIVA.

Bem, o post realmente ficou muito longo...hehehe... mas eu queria que todos soubessem que é possível sim acabar com a matança no candomblé, que basta boa vontade e esclarecimento, e que soubesse também que muitas vezes o que move essas pessoas que defendem o sacrifício não é a religião, e sim o dinheiro e o suposto poder que ela pode proporcionar aos inescrupulosos.

 E também para dar aqui alguns argumentos para uma boa discussão... rsrsrsrsrs...

FONTE: http://verdesfolhas.blogspot.com.br/2011/01/por-que-o-candomble-verde.html


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