O culto aos Orisás é o culto à natureza.
A harmonia com as forças da natureza é que torna o lado humano dos Orisás tão forte e sagrado.
O templo dos Orisás é a natureza.
O culto ao Orisás, o Candomblé não se tornou uma religião institucionalizada como outra qualquer.
Também não é uma seita mágica.
O Candomblé é uma filosofia de vida.
Consiste em toda uma ideologia que permeia moral, ética, coerência no pensar e no agir que vai totalmente à contra mão dos valores do mundo capitalista-cristão.
Em África o culto era praticado nas aldeias e cidades ao ar livre, em sua maioria.
Nos centros dos aglomerados sociais, à beira de rios e cachoeiras e no interior das florestas e savanas se praticavam a maior parte dos rituais.
No Brasil, o contexto social, assim como as condições espaciais, se transformou a partir do processo de intensa urbanização.
Os negros libertos que formaram os Candomblés de Nação o fizeram nos centros urbanos, em Salvador, no Rio de Janeiro e mais tarde em São Paulo.
Posteriormente foi se espalhando para outras cidades.
O contexto urbano não proporcionava mais o contato direto e livre com a natureza como espaço de vivência.
Da mesma forma o contexto social e político da sociedade escravista não permitia o culto aos
Orisás, mesmo aos negros livres.
Por isso os negros alforriados e livres se organizaram, adquiriram espaços formando então os terreiros de Candomblé.
Tais terreiros constituídos em casas, chácaras e sítios concentravam os cultos em seu interior, mas não por uma simples opção e mudança da tradição.
O espaço urbano e principalmente a proibição por parte do poder público impôs tal condição. Isso não significou que a natureza deixou de ser o único e principal templo de culto.
Mesmo quando os africanos foram arrancados de seu território natal, continuaram essa mesma relação em seu processo de mais de trezentos anos de resistência à escravidão.
Nos quilombos principalmente se reproduzia todo um comportamento e maneira de pensar estritamente original.
Posteriormente, com a formação dos Candomblés de Nação limitados às populações negras, isso se manteve por muito tempo.
O declínio, ou mesmo distorção dessas relações se dá após a segunda metade do século XX (1950 em diante) quando as práticas religiosas africanas começam a sair do âmbito criminal e começa a ser tratado pelo poder público como resquícios culturais, ou folclore, como queira.
A partir de então os rituais e tratamentos espirituais como o jogo de Búzios, o Ebó, o Bori e até mesmo a iniciação tornaram-se produtos de comércio.
O Candomblé passou a ser procurado pelas pessoas, principalmente intelectuais e artistas, como uma religião alternativa, onde não era necessário seguir os padrões de comportamento cristãos, mas sem a noção de que no Candomblé também existe um padrão de comportamento.
E tal padrão pode ser considerado tão ou mais rígido do que aquele imposto pela maioria das religiões.
A diferença é que justamente ele não é imposto, mas sim esclarecido, e se o iniciado não cumpre, não leva punições da Casa ou do Babalorisá, ele simplesmente não se coloca como um praticante de sua própria religião.
E os resultados disso são subjetivos, porém óbvios.
Ao longo das gerações que procederam e propagaram os cultos, a relação foi se transformando.
Hoje casas de Candomblé se tornaram verdadeiros templos suntuosos, semelhantes à templos cristãos, que simbolizam a riqueza material daquela casa.
Temos leis e decretos que permitem o culto e a prática de rituais em espaços naturais, desde que feito com consciência, e mesmo assim a natureza enquanto templo está perdendo seu valor para os praticantes do culto ao Orisás.
Isso por que os valores materialistas e consumistas do mundo atual estão inseridos no modo de pensar candomblecista.
Terreiros suntuosos, roupas caríssimas, jóias, fartura exagerada de comidas e bebidas simbolizam Asé.
Riqueza, bens materiais, muito dinheiro e fama simbolizam Asé.
A força espiritual está ficando, cada vez mais, em segundo plano.
A força do dinheiro em primeiro.
Hoje, o Orisá é forte à medida em que seu filho conquista bens materiais, e não felicidade, ou melhor, a felicidade através de bens materiais, como na sociedade consumista.
E se essa felicidade pelos bens materiais, pelo sucesso financeiro não vem o Orisá não é bom, o Babalorisá não é bom, então pode e deve ser abandonado para se tentar a sorte em outra religião, na maioria das vezes evangélica.
O lado religioso, litúrgico, ritualístico do Candomblé recebe tratamento de mágico, místico e folclórico pelos próprios adeptos. Iniciados não colocam sua própria religião no mesmo patamar de outras.
Para muitos é uma religião visual, em que roupas bonitas e suntuosidade são prioridades. Sendo que na verdade a verdadeira essência do Candomblé não se vê, apenas se sente.
Autor: Alan Geraldo Myleô
FONTE: O Candomblé e a Essência do Ser
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