Podem acreditar que, não existe nada que eu tenha lido ou ouvido que remeta a ligação de òrìṣà (orixá) como sendo um elemento da natureza.
Vou me explicar adiante, mas, na minha opinião isso se trata apenas de sincretismo mal feito com as tradições pagans da Europa em geral, incluindo a Grécia onde o panteão dos deuses dessas tradições era associado com comportamente, especialidades e elementos.
Estas religiões politeístas tinham uma característica comum que era a de dedicar cada um dos seus deuses a uma especialidade. Isto era necessário porque os deuses representavam o mundo que viviam e, como nas tradições politeístas, não existe uma divindade maior que originou tudo, cada divindade ou deus tinha que ser responsável por um aspecto do universo. Assim a unidade era na verdade formada pelo conjunto de todos.
O poder era dividido e não havia preponderância de uma divindade sobre a outra, como na natureza, uma coisa poderia fazer ou desfazer o que outra fez e o homem devia prestar algum tributo a todas se quizesse ter paz. Este é o modo da natureza, as forças se equilibram pela harmonia ou pelo conflito. Claro que a existência de cada deus estava associado a necessidade de alguém controlar alguma coisa e por isso a necessidade de muitos deuses. O sentido da palavra panteão, que é usado incorretamente para a religião Yoruba, é este, esta vasto conjunto de deuses controladores da ordem.
Para tornar as coisas mais complicadas, a igreja católica criou uma denominação genérica e sem nenhum significado real, de PAGAN, para qualquer outra religião que não fosse Abraamica, ou seja, que tivesse origem em Abraão o patriarca que gerou as correntes do Judaismo, cristianismo e islamismo. Estas 3 religiões competem pela posse do mesmo deus e tem a mesma origem. Os Judeus não reconhecem mais ninguém, afinal eles é que são os escolhidos. Os cristão que nasceram judeus, reconhecem uma das partes do judaismo que é o antigo testamento e por fim, os mulçumanos, os mais recentes, século VII, reconhecem tudo das anteriores, inclusive Jesus, mas não a trindade católica.
Dessa maneira ao longos dos últimos séculos, eles tem se matado, sempre em nome do mesmo deus sanguinolento, Jeová.
Para os Cristão, que dominaram o mundo à força da espada, aliás como também o fizeram os judeus no seu tempo, o que não era católico era Pagão. Eles só não tiveram coragem de chamar os Judeus de Pagãos, mas criaram o termo herético, para aqueles que divergissem da interpretação teológica oficial de Roma... Assim, pagão, não tem significado religioso, significa tudo o que não e católico.
Os abraamicos consideram o seu deus, Jeová, o único e defenestram qualquer outro tipo de manifestação religiosa. A partir do século XV a igreja católica baniu toda as praticas que mostrassem similaridades com simpatias, encantamentos e feitiços. A igreja medieval era totalmente esotérica, mas para se afastar disso eles baniram completamente essas
práticas, de modo a poderem a partir do século XV dominar os seus fiéis através do temor ao mal, ao diabo e a perseguição ao pecado. Estudiosos do aspecto do Mal na religião correlacionam o surgimento da força do diabo com a necessidade de um controle mais rigoroso da sociedade pela forma política, uma vez que, esse temor (ao diabo) e domínio (o pecado), não existiam anteriormente. Igualmente isso coincidiu com os papas-generais, guerreiros que literalmente com a espada na mão construíram a Igreja que conhecemos hoje.
O próprio celibato, que não havia, dizem, foi devido a igreja passar a ter posses. Eles não queriam se envolver em disputas judiciais com esposas de padres, bispos e papas. Enfim, a força da reforma, de Lutero e Calvino, obrigou a igreja a mudar sua posição e adotar políticas mais ativas e restritivas ao seu clero.
No centro de todo este conflito ficaram as religiões de fato politeístas que tinham uma interpretação diferente da divindade e dos seus poderes. As correntes celtas e bruxaria tradicional viam a terra como centro de tudo. Assim a natureza era o sagrado e seus poderes eram invocados através de nomes que os traduziam.
Os politeísmos clássicos não tinham a idéia de uma divindade superior. O poder era compartilhado e uma coisa influenciava a outra. A vida era mais simples e mais lúdica. esse mesmo tipo de religião ocorria em Roma e também na grécia. Assim duas coisas co-existiam, o politeísmo no qual o poder sobre a natureza era exercido por multiplas fontes e um grande número de deuses que traduziam esses poderes que eram a natureza em si. O uso da palavra Panteão esta assim associado não somente a um número grande de deuses mas também ao politeísmo. Essas religiões passaram a ser então a tradução da palavra paganismo.
A expansão européia para a Africa expôs os europeus, sufocados por séculos de opressão religiosa, a um novo conjunto de culturas e também de religiões. Os métodos científicos estavam longe de terem sido os mais éticos, assim como os primeiros a irem para a Africa estava longe de serem os cultos e eruditos preocupados (mesmo que minimamente) em estudar, conhecer a verdade e respeitá-la. Os primeiros foram os comerciantes, que somente visavam o seu lucro e militares que apenas queriam impor sua vontade.
A interpretação e análise do que eles encontraram foi assim um misto de simplificação e sincretismo. Acredito que longe deles se preocuparem em entender de fato as culturas locais, a sua idéia de superioridade tornava todo o resto menos importante. Dessa maneira, aliado a incapacidade deles em se comunicarem livremente com os nativos, devido a lingua, a religião encontrada na Africa por similaridade de características grosseiras, foi associada ao que já encontravam no paganismo Europeu. Não houve uma preocupação de de fato se entender o que se encontrava.
Temos que reconhecer que métodos científicos e ética científica se hoje em já não são fáceis de serem encontrados, naquela época era muito, mas muito mais difícil.
A religião Africana por sua vez não é simples. Estava longe de ter uma perfeita uniformidade ou mesmo estar pronta a se adaptar aos padrões classificatórios europeus. Assim, entre 2 opções básicas monoteísmo e politeísmo, sem muito pensar, foi considerada politeísta em vista da quantidade de Deuses encontrados. Sendo politeísta e considerando a natureza cheia de espíritos, tinha que ser similar as diversas correntes Pagans já existentes e conhecidas.
Mais recentemente esta questão tem sido revisitada e novas classificações tem sido criadas para se classificar culturas e religiões mais complexas, mas, para o povo comum pode ser que isso nunca chegue assim, a cultura dominante no mundo ocidental é a Abraamica e assim, ou você é monoteísta ou politeísta.
Em função disso a religião africana, no geral, mas principalmente e Candomblé, ganhou o cunho de paganismo e seus Deuses, tipicamente ancestres, viraram forças da natureza. Entretanto, não existe nada que de valor a isso. No caso do Brasil o kardecismo francês criou toda uma visão espiritual própria que se ligou a Umbanda. Como a Umbanda erroneamente (tão errada como usa nomes de santos para seus guias ela usa nome de Orixás do Candomblé. Ambos sem nenhuma relação) se ligou a Orixás, essa mistura confundiu as pessoas que se confrontaram com a visão distinta do Candomblé.
O mal entendimento do Candomblé passou por essa associação e também por pessoas como Nina Rodrigues que nada sabiam de Candomblé e que passaram a escrever como se tivessem algum autoridade sobre o assunto.
Tudo isso acabou colocando as religiões não cristãs, no Brasil, em um mesmo saco, furado, de ideologia espírita.
O esoterismo europeu é fortemente influenciado pelos cultos ditos pagãos, como os celtas, stregheria e com o renascimento da bruxaria na forma da Wicca. Outro aspecto influente são as irmandades gnósticas como roza-cruzes, thelema e por ai vai. Tudo isso exerce forte influência sobre a nossa sociedade ao direcionar o entendimento do que seja não cristão ou esotérico.
Em função da lastimável e miserável formação religiosa dentro do Candomblé, estes conceitos de força da natureza se estabeleceram dentro do próprio Candomblé. Os Babalorixá e Iyalorixás, apesar de terem a propriedade para falar, mas, sem qualquer capacitação passaram a repetir esses conceitos que lhes eram impingidos pela sociedade culta.
Os que não gostam de ver eu dizer que a formação religiosa do Candomblé é deficiente devem observar que o acesso a mitos ou poemas de Ifa é restrito ou inexistente. O hábito de discutir teologia no Candomblé não existe. Você não consegue juntar 3 babalòrìṣà (babalorixá) sem que seja para eles rasgarem seda entre eles. Poucos estão dispostos a colocar em questão o que sabem ou o que pensam, exceto se for uma cátedra onde ele fala e outros ouvem.
Essas pessoas normalmente não são preparadas para, falar em público, discutir suas teses, dirigir pessoas, lidar com desafios verbais e até mesmo orientar o aprendizado de pessoas. São muitas vezes pessoas muito boas, agradáveis e com conhecimento das suas liturgias.
Existe uma dificuldade na formação de sucessores. Pior, as pessoas não se preparam e se capacitam para ter uma casa. Existe uma legião de pessoas com pouco ou nenhum acesso a conhecimento que mesmo assim, sem legitimidade ou capacidade abrem casas e passam a ser auto-titular de sacerdotes e representantes da religião.
É claro que essas pessoas, sem terem aprendidos com os seus mais velhos, tem que se virar com algo ou com o que tem. É neste campo que essas concepções idiotas florescem. O que mais vemos é pai de santo, metido a besta, que responde perguntas usando os conceitos do kardecismo-espirita. Mas, afinal, eles vão dizer o que? Que não sabem?
É claro que a vertente conhecimento não é o forte do Candomblé. A vertente forte é a devocional, a fé. Para isso você não precisa saber o que é, você sente o que é e você também acredita porque sente e vê. A resposta mais comum para quando se pergunta uma coisa do tipo o que é o Candomblé ou o que é o òrìṣà (orixá) ou qualquer coisa de aspecto mais teológico será algo que começa com "eu amo meu òrìṣà (orixá)..." e por ai vai uma torrente de expressões de sentimento e fé. Isso reflete o que ela sabem, e elas sabem o que sentem.
Esse é o jeito pelo qual esse tipo de sincretismo é aceito e prolifera. Assim como os africanos fizeram no passado com os antropólogos, as pessoas sabem o que é, elas sentem o que é, e se esta definição, de elemento da natureza satisfaz o inquisidor, que o seja. Isso não impede entretanto que em espaços ou oportunidades como essa a gente possa visitar ou revisitar questões como essa, ou a reencarnação ou o conceito de nascimento e destino, as proibições, etc... evitando assim que da nossa própria boca saia coisas como o Karma.
É claro que saber ou não o que parece certo não faz uma pessoa fazer melhor um santo do que outro. àṣẹ (axé) e roncó é outra coisa, mas, não tem nada demais a gente poder tratar dos assuntos com outra base.
http://ileasenibaim.com.br/sincretismoorigem.htm
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