Para o povo de santo, falar sobre as iguarias oferecidas aos seus Orixás não é o mesmo que informar sobre o cardápio de um dia de festa.
Dizer as coisas que o santo come é quase como revelar um segredo, um espaço de foro íntimo de cada terreiro.
A ausência de muitos pratos, a presença destes sem nomes, silêncios, lapsos de memória, muitas vezes, antes de ilustrarem um desconhecimento, constituem parte de um saber, muito especial, guardado pelos mais antigos na religião, a que só poucos tem acesso.
Bastante impressionante o que certa vez ouvi de uma Yalorixá: " a Yabassê é aquela que muito faz e pouco fala".
O não falar insere-se no contexto onde a oralidade constitui um dos veículos mais fortes de transmissão do conhecimento, os chamados segredos, fuxicos de santo, ensinamentos rituais, fundamentais, na sua grande maioria balbuciados no ouvido do iniciado, ou passado em palavras incompreensíveis e fórmulas incompletas.
As comidas oferecidas no terreiro aparecem sempre como algo particular, pertinente àquela casa. Receitas pela metade, pratos sem nomes, queixas e justificativas somam-se, ao lado de recriações, a todo instante, no fogão dominado pela Yabassê.
Da África, os Orixás vieram de diferentes lugares, antigos reinos africanos, muitos deles inimigos. Diferentemente das suas regiões de origem, o culto dos Orixás no Brasil, antes de estar ligado à uma família, uma confraria, foi ampliado e praticado num mesmo espaço.
Destruída a família clânica, extensa, sua noção vai ser reconstruída no solo brasileiro como uma grande família teológica, chamada família de santo.
No Brasil, esse universo teológico foi perpetuado mas também reinterpretado. Muitos Orixás não poderam mais ser cultuados, outros transformaram-se na vinda para o Novo Mundo.
Assim como outrora na África, muitos deles trocaram de nome, mudaram de região ou até mesmo cairam no esquecimento, por conta de migrações, ou de guerras que obrigavam o grupo a peregrinar de um canto a outro.
Não levavam seus rios, mas objetos sagrados em torno dos quais reorganizavam o culto de seu orixá.
Dos diversos Orixás introduzidos no Brasil, dezesseis são os mais conhecidos e cultuados pela maioria dos terreiros, embora se saiba que este número é também simbólico
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