A Lavagem das Escadarias da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim é uma das festas mais populares de Salvador.
A homenagem ao Senhor do Bonfim é muito antiga na Bahia, embora haja controvérsias sobre sua origem portuguesa ou africana. Esta cerimônia acontece no dia 11 de janeiro. Um imenso cortejo de devotos percorre dez quilômetros de Salvador, partindo do Largo da Conceição até o Largo do Bonfim. Baianas vestidas a caráter trazem moringas e potes cheios de água perfumada para a lavagem simbólica das escadarias da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim.
Atualmente, cantos e hinos religiosos misturam-se ao som dos trios elétricos na festa, que é o maior exemplo do sincretismo religioso na Bahia, pois o ritual homenageia também Oxalá (Obatalá), que no candomblé é identificado ao Senhor do Bonfim. Os participantes bebem, comem e divertem-se durante o percurso, antecipando o Carnaval de rua de Salvador.
Origem - Os estudiosos de mitologia negra dizem que a Lavagem do Bonfim é uma cerimônia que tem origem na África, em homenagem à divindade yorubá Oxalá. Câmara Cascudo discorda: acha que na Festa do Bonfim há convergência de dezenas de festas tradicionais da Europa e da África. Roger Bastide observa que a cerimônia não é de origem africana, pois já existia em Portugal. Teria sido difundida no Brasil por um português combatente na Guerra do Paraguai que fizera o voto de, caso não morresse, lavar o átrio do Senhor do Bonfim. Os negros baianos transformaram a lavagem em uma festa sincrética ao catolicismo e ao candomblé.
Pelo fato de ultrapassar os limites da liturgia católica, a Lavagem do Bonfim chegou a ser proibida pelo Arcebispo da Bahia e impedida de ser realizada pela Força Pública de Salvador no ano de 1890.
Hino do Senhor do Bonfim
O Hino do Senhor do Bonfim (João Antonio Wanderlei - Peiton de Vilar) foi divulgado nacionalmente a partir de sua inclusão no disco Tropicália, considerado um dos manifestos da estética do Movimento Tropicalista do final dos anos 1960. Com arranjo e regência de Rogério Duprat, o hino é interpretado por Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Os Mutantes, fechando o disco de forma apoteótica.
Glória a ti neste dia de Glória
Glória a ti redentor que há cem anos
Nossos pais conduziste à vitória
Pelos mares e campos baianos.
Dessa sagrada colina
Mansão da misericórdia
Dai-nos a Graça Divina
Da Justiça e da Concórdia
Glória a ti nessa altura sagrada
És o eterno farol, és o guia
És, Senhor, sentinela avançada
És a guarda imortal da Bahia.
Dessa sagrada colina
Mansão da Misericórdia
Dai-nos a Graça Divina
Da Justiça e da Concórdia
Aos teus pés que nos deste o Direito
Aos teus pés que nos deste a Verdade
Trata e exulta num férvido preito
A alma em festa da nossa cidade.
Dessa sagrada colina
Mansão da Misericórdia
Dai-nos a Graça Divina
Da Justiça e da Concórdia.
Luiz da Câmara Cascudo
Câmara Cascudo, folclorista, antropólogo e um dos mais produtivos estudiosos da cultura brasileira, escreveu no seu Dicionário do Folclore Brasileiro que nas Compitais romanas (festas em honra aos deuses Lares, protetores das encruzilhadas) e na grande Panatenéia grega (festa realizada em Atenas para homenagear a deusa Minerva) as encruzilhadas e o Partenon eram lavados, molhados ao som de cânticos. Os ídolos sempre tiveram seus dias de preparo votivo, especialmente Mercúrio em Roma ou Hermes na Grécia, e no Egito, Anúbis. Para Cascudo, também na África havia cerimônias de lavagem de imagens ou símbolos santificados.
Roger Bastide
Um dos primeiros professores da Universidade de São Paulo, Roger Bastide, antropólogo francês radicado no Brasil, contou, em seus Estudos afro-brasileiros (São Paulo, 1946), sobre o português que pela primeira vez teria lavado a escadaria do Bonfim. Ao subir em peregrinação, foi explicando o que ia fazer àqueles que encontrava e, pouco a pouco, foi-se formando à sua volta um pequeno grupo: nascera a cerimônia. Mas os pretos, que tinham o costume, nas suas religiões, de lavar os objetos sacrificiais com óleo de dendê, sangue ou água da fonte sagrada, confundiram naturalmente as cerimônias. Para eles, Oxalá era o homenageado.
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