quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Oni Ewé: o culto de Ossaim e o uso litúrgico das plantas nos candomblés iorubás no Brasil

Oríkì fún Òsónyìn


Ìba Òsónyìn


Ìba oni èwé


kó si arun


Kó si akoba


Àse


Oríkì para Òsónyìn


Elogio para o espírito do medicamento das folhas


Eu elogio o dono do medicamento das folhas


Me livre de adoecer


Me livre da coisa negativa


Eu dou graças ao dono do medicamento


Axé


A fitolatria é uma característica central dos candomblés iorubas.

As folhas são consideradas sagradas e sua utilização é um dos principais awó(segredo) dos sacerdotes.

O uso litúrgico das folhas é um dos mais complexos rituais e requer sacerdotes especializados denominados babalossaim.


As folhas ou ervas sagradas pertencem ao Orixá Ossaim, o Oni Ewé(dono das folhas).Um dos mais conhecidos mitos iorubas justifica esse pertencimento:


Ossaim era o filho caçula de Iemanjá e Oxalá e, desde pequeno,vivia no mato .Tinha uma habilidade especial para tratar qualquer doença , por isso viajava pelo mundo inteiro , sendo sempre recebido com carinho pelo rei de cada tribo.

Ele recebeu de Olodumaré o segredo das folhas ; assim sabia qual delas curava doenças , trazia vigor ou deixava as pessoas mais calmas .

Os outros orixás invejavam Ossaim por isso .

Em troca dos suas curas ,Ossaim aceitava fumo, mel e cachaça.

Xangô , que era temperamental, não admitia depender dos serviços de Ossaim, e por isso pediu sua esposa Iansã , orixá que domina os ventos, para que as folhas voassem em direção a todos os Orixás para que cada um desses tivesse suas folhas particulares .

Assim Iansã fez. Soprou forte seu afééfe(vento), espalhando todas as folhas se Ossaim.

Em meio a ventania , Ossaim exclamava “ewé àsa”( minhas folhas).

Esse tipo de reza permitiu que Ossaim reservasse para si o segredo das folhas .Embora cada orixá possua suas folhas, somente Ossaim sabe os encantamentos (ofó) delas.

Dessa forma, Ossaim é considerado o senhor do Igbo, da floresta e o patrono do curandeirismo e da medicina.

Ossaim é o orixá masculino do ar livre, governa a floresta, juntamente com Oxossi. Senhor do axé (força ) existentes nas folhas e nas ervas , ele não se aventura nos lugaresonde o homem modifica os espaços ,construindo edificações .

É bastante cultuado no Brasil sendo o Orixá da cor verde, do contato mais íntimo e misterioso com a natureza. Seu domínio estende-se ao reino vegetal, às plantas, mais especificamente às folhas, onde corre o sumo. Por tradição, não são consideradas adequadas ao Orixá Ossaim, as folhas cultivadas em jardins ou estufas, mas as plantas selvagens, que crescem livremente sem a intervenção do homem.

As áreas consagradas a Ossaim nos candomblés iorubás são os pequenos recantos e as passagens mais isoladas das florestas, onde só determinados sacerdotes (babalossaim) podem entrar.

A cerimônia onde as folhas de ossaim são colhidas e encantadas são denominadas sassayim O emblema de Ossaim é uma haste central de ferro rodeada de outras seis , com um pássaro de ferro na extremidade da haste central representando seu poder de feitiçaria .

Ossaim é uma divindade de extrema significação, pois praticamente todos os rituais importantes utilizam, de uma maneira ou de outra, o sangue escuro que vem dos vegetais, seja em forma de folhas , infusões para uso externo ou de bebida ritualística.


As folhas no sistema litúrgico iorubá pode ser classificadas de acordo com os quatro elementos da natureza: ar, terra, fogo e água.

Assim, existe as folhas do ar(ewé afééfé), as folhas do fogo (ewé inã), as folhas da água(ewé omi) e as folhas da terra (ewé ilé ou ewé igbo).

Dessa divisão , as folhas são reclassificadas quanto a sua propriedade de ser quente ou fria, ou seja, sua capacidade de agitar ou acalmar uma pessoa.

Quando a folha é fria é denominada de ewé erro, quando é quente se denomina ewé gun.

As folhas frias estão relacionadas aos orixás do elemento ar e do elemento água como Oxalá, Oxum, Yemonjá.

Essas folhas são as recomendadas para os chamados banhos da cabeça aos pés.

As folhas quentes são relacionadas aos orixás da terra e do fogo e seus banhos devem ser, exceto em casos especiais, do pescoço aos pés.


As folhas também se classificam quanto ás suas características masculino/feminino, negativo/positivo, esquerda/direita ,fecundantes/ fecundáveis.

As folhas masculinas são consideradas folhas positivas e da direita(ewé apa òtún) e as folhas femininas são compreendidas como folhas negativas e de esquerda(ewé apa òsí).

As ewé inã e as ewé afééfé são consideradas folhas fecundantes e as ewé ilé e ewé omi são consideradas folhas fecundáveis.


O agbó sagrado, mistura de sangue vegetal fundamental em vários aspectos da liturgia dos candomblés iourubás, é compreendido de 16 folhas , sendo 8 folhas gerais (fixas) e 8 folhas variáveis conforme o carrego de santo de cada pessoa .

As oito folhas gerais ,segundo a classificação de Pessoa de Barros são: pèrègun,toto,rínrín, ewé òwù,tètèregun, awùrepépé, ewé ogbò, gbòrò ayaba.


Essas folhas juntamente com elementos com ossum, wagi e efum constituem elementos primordiais e sua ocorrência no Brasil dependeu, principalmente, da utilização nas seitas religiosas.


Dentre as plantas oriundas do continente americano ou nativas do Brasil estão:


A folha de pèrègun (dracena fragans (l.) Ker Gawl)é popularmente conhecida como dracena, nativo, pau-d’água e coqueiro-de –vênus.

Pertencente ao orixá Ogum e ao elemento terra/ masculino , é uma planta de origem africana e largamente difundida no Brasil .

O peregun possui grande importância na liturgia dos candomblés iorubas .

É uma folha protetora dos espaços , demarcando ambientes sagrados.

Constitui ainda uma folha para decoração dos salão públicos , pejis e assentamentos de Orixás ,além de entrar na indumentária de muitos Orixás como Ossaim.


O tètèregun( Costus spicatus Swartz.), planta nativa do Brasil conhecida como cana -do -brejo,é considerada a “folha da vida e da morte”, entrando nas liturgias de iniciação.

É uma folha representativa dos ritos de passagem e inserida nos cultos aos Orixás no Brasil.


A planta awùrepépé (Spilanthes acmella) é nativa da América do Sul e encontrada em todo Brasil.

Nesse recebe os nomes de agrião-do-pará,jambu e treme-treme.

Pertence aos orixás Oxalá e Oxum.

É uma das plantas que entra nas misturas vegetais para “abrir a fala” dos orixás.

Muito utilizada na culinária do norte do país , constitui de outra readaptação vegetal na liturgia iorubá.


O gbòrò ayaba(Ipomoeapes-caprae), conhecida como salsa-da-praia no Brasil, é uma planta originária da Améria tropical.

Pertence ao Orixá Yemonjá e ao elemento água.

Yemonjá está relacionada ao culto de orí(cabeça) .

Ya Orí(mãe das cabeças) é um dos títulos desse Orixá.


As plantas de origem asiáticas compreendem:


O ewé òwù( Gossypium barbadense), folha conhecida no Brasil como algodoeiro, pertence aos Orixá Oxalá e Orumilá sendo representante do elemento ar.

Planta originária da China , o algodão tem ampla utilidade nas liturgias dos candomblés .

O algodão é uma planta pertencente ao odu Osá, signo feminino do sistema oracular de Ifá, responsável pelo fluxo menstrual e pelo útero.

Osá é o principal signo das Ya mi oxorongá, as grandes feiticeiras africanas.

Na fitoterapia, o algodão é indicado para combater disfunções do ciclo menstrual e dores no útero.


O tótó(Apinia zerumbet) é conhecida no Brasil como a folha de colônia. Pertence aos Orixás Oxum, Yemonjá e Oxalá.

Planta originária da Ásia e,largamente ,cultivada no Brasil devido sua adaptação ao clima tropical.

Planta de fundamental importância nos candomblés iorubas, é recomendada para acalmar as pessoas e no combate à histeria.


Dentre as de origem africanas estão:


A folha de rínrín( Peperomia pellucia) ,conhecida no Brasil como alfavaquinha de cobra e/ou oriri de Oxum ,é uma planta de origem africana que se proliferou por todo o Brasil.

Pertence ao Orixá Oxum , estando articulada ao elemento água.

Essa planta está articulada com os olhos pois Oxum é a única divindade feminina relacionada ao culto de Ifá.

Oxum é aptebi( título honorífico no culto de Ifá) do culto do deus da advinhação ,por isso as práticas oraculares recorrem freqüentemente a essa planta.

No Brasil, o oriri de Oxum além de ser uma planta voltada para vidência de jogo de búzios ,também é uma planta utilizada em trabalhos para fins amorosos.

Isso , possivelmente, se deve ao fato do Orixá Oxum ser considerada o orixá do amor.


A folha de ewé ogbò( Periploca nigrescens ), pertence aos orixás Oxossi e Ossaim.

Originária da África tropical, trazida pelos iorubas para o Brasil , esta planta está aclimatada no país .

É uma das plantas utilizadas para alterar o estado de consciência dos filhos de santo.

O ewé ogbó é popularmente conhecido no Brasil como rama-de-leite, cipó-de-leite ou orelha de macaco.


Efum, wagi e ossum são três elementos africanos largamente utilizados no Brasil.

Esses elementos simbolizam a iniciação sagrada nos candomblés nagôs.

Representam as três cores da iniciação: o branco, o azul e o vermelho.

Na festa pública, onde o yaô é trazido ao salão público , o rito compreende “três saídas”, ou seja, três aparições públicas do yaô.

Esse triplo momento relaciona-se diretamente com o efum, uagi e ossum.

O efum é um pó mineral branco, conhecido no Brasil como pemba africana.

É substituído no Brasil pelo pemba brasileira(giz).

O wagi é o pó vegetal azul e seu uso é largamente usado no Brasil, sendo freqüentemente importado da Nigéria.

O ossum é um pó vermelho de origem vegetal.

No Brasil seu sucedâneo é o urucum, elemento muito utilizado na culinária brasileira.

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